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Gilvan Pernet: Emancipar para salvar mais vidas

13 junho, 2014

editada

Nesta entrevista, o ex-comandante do Corpo de Bombeiros do município de Paulo Afonso, o tenente-coronel Gilvan de Macedo Matos Pernet destacou a necessidade da separação do Corpo de Bombeiros da Bahia da Polícia Militar. Segundo ele, a independência trará benefícios incontáveis à população baiana, que tem sofrido sérias consequências por conta da falta de assistência. Para alertar a sociedade sobre a importância da emancipação, ele divulgou artigos através das redes sociais e se reuniu com parlamentares.

Como é a atuação do Corpo de Bombeiros? Qual a principal tarefa?

No meu ponto de vista, a principal tarefa hoje é o desencarceramento de vítima presas em ferragens, com atendimento pré-hospitalar. Em segundo lugar, ficariam os outros acidentes, principalmente os domésticos, e as ocorrências de combate a incêndio. Mas, a prevenção é muito mais importe do que a atividade propriamente dita de combate. Quando há a necessidade do combate, é sinal de que houve falha na prevenção. A expectativa nossa, inclusive, é que, com o surgimento da nova Corporação do Corpo de Bombeiros Militar da Bahia, venha essa estruturação e o Centro de Atividades Técnicas tenha uma estrutura bem diferente da que tem hoje, para que possa atender melhor a sociedade e fazer as vistorias que devem ser feitas. Só para se ter uma ideia, na Bahia é feito apenas 1% das vistorias realizadas no Rio Grande do Sul. Então, tem uma trajetória imensa a ser modificada em relação às vistorias em empresas e edificações, para que se evite tragédias, como a que aconteceu na Boate Kiss, em Santa Maria.

Você falou que aqui só é feito 1% das vistorias de outros estados. Por que essa deficiência?

Aqui não tem um Código de Incêndio. Foi aprovada no final do ano passado a Lei de Incêndio e Pânico. Mas, para valer, tem que ser regulamentada. A partir do momento desta regulamentação é que o CB vai ter poder de fiscalização, de polícia, para multar, advertir, embargar uma obra que apresente risco e evitar tragédias. É a partir do CI que isso vai começar a acontecer realmente. Se lá no Rio Grande do Sul é feita vistoria e aconteceu aquela tragédia, imagina aqui.

Você foi o comandante do movimento em prol da separação do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar, que aconteceu lá em Paulo Afonso. O único em trinta anos de história. Por que essa necessidade de emancipação?

Nós estamos presos a uma instituição que já tem outras atribuições… pesadas… na área de segurança pública. Então, fazer duas coisas? Um comando que pense tanto na segurança pública quanto nas atividades do bombeiro é muito complicado. Então, o certo é ter as estruturas separadas, igual a todos os outros estados do Brasil. Somente Bahia não é e o Rio Grande do Sul está em vias de separação. Paraná acabou de ter a separação.

Como o Corpo de Bombeiros vai se manter após a separação? Vai ter recursos?

O governo aprovou no final do ano passado que cria o Funebom (Fundo Específico para os Bombeiros), no qual tudo o que se arrecada, com a finalidade da atividade de bombeiro, taxa de incêndio e vistorias por exemplo, vai para este Fundo. É uma garantia espetacular para o Corpo de Bombeiros ter recursos para montar sua estruturação e ter o crescimento que deve para oferecer o bem à sociedade.

O que tipo de atividade você tem desenvolvido para poder disseminar essa questão da emancipação?

Sempre quando convocado, estamos à postos. Recentemente, eu estou com um mini programa em uma rádio FM evangélica (94,9) sobre as formas de prevenção de acidentes. Já tivemos duas edições, nas quais tratei sobre acidentes domésticos, que atingem ainda muita gente no país. São muitas pessoas que poderiam, com alguns cuidados, evitar. Inclusive, estamos em período de festas juninas, quando a incidência de acidentes com fogos de artifício é muito grande e aumenta o número de incêndios, principalmente por conta da utilização dos balões, que mesmo proibidos ainda existem pessoas que usam. Vamos focar exatamente na prevenção para evitar este perigo. O que a mídia não tem feito. A gente reconhece que fala-se muito da gravidade dos casos, mas não se tem um trabalho de orientação. Então, a nossa proposta é justamente neste sentido. É muito melhor trabalhar com prevenção do que atuar nas atividades de combate.

Em que a sociedade ganha com a prevenção?

Primeiro, o sofrimento poderia ser evitado. E há também o custo, que termina sendo muito elevado. Praticamente, hoje, metade dos leitos em hospitais é para atender vítimas de acidentes de trânsito e uma parte para vítimas de acidentes domésticos. Então, sobra pouca coisa para atender os demais pacientes. Se a gente trabalhar neste sentido, imagino que o Estado e a área de saúde vão lucrar. Se evitarmos os acidentes ou assistir com mais eficiência, muitos leitos vão deixar de ser ocupados por estas vítimas e os corredores de hospitais, possivelmente, não ficarão mais lotados de gente à espera de atendimento.

Você tem dado amplo destaque em seus textos divulgados nas redes sociais à questão dos acidentes de trânsito. É por isso?

Está em primeiro lugar em número de ocorrências atendidas pelos Bombeiros. O que está acontecendo na prática? Em função de o SAMU estar mais descentralizado, com muito mais unidades de atendimento, do que o Corpo de Bombeiros no estado, as pessoas que trabalham nos locais de acidentes, como não têm equipamento para desencarcerar as vítimas que estão presas nas ferragens, ficam aguardando o Bombeiro chegar, o que muitas vezes demora horas. Assim, muitas vezes a vítima chega a óbito. Não é interessante para um profissional ficar esperando o socorro adequado, vendo a vítima morrer, sem poder fazer nada. Por conta disso, a descentralização é muito bem-vinda para evitar isso aí. Então, que chegue o SAMU. Mas, que chegue imediatamente também o Corpo de Bombeiros. Em nossas rodovias, os acidentes têm se tornado cada vez mais comuns. Em função da velocidade. As pessoas estão achando que estão protegidos, por conta dos acessórios dos veículos, como freios ABS, airbags e outros dispositivos de segurança. Com isso, os motoristas estão imprimindo uma velocidade maior, envolvendo-se em acidentes, cada vez também mais graves.

O que poderia contribuir para a redução destes índices?

Para minimizar este quadro, precisamos ter o Corpo de Bombeiros bem forte. Mas, atualmente a estrutura é muito pequena. A gente atende a menos de 5% dos municípios baianos e tem locais em que o Bombeiro mais próximo está a cerca de 400 quilômetros de distância. Então, um acidentado que está aguardando a chegada dificilmente vai resistir, por conta das condições e da gravidade do acidente. Quanto mais demora, mais pessoas deixam de ser atendidas, mais pessoas vão morrer e mais vão ficar com sequelas graves, que talvez não ficariam, caso tivessem assistência adequada rapidamente. Por isso, temos que encarar esta questão da emancipação com bastante seriedade e tentar resolver o mais rápido possível.

Como está a expectativa para a aprovação da PEC na Assembleia Legislativa?

A expectativa é de que seja aprovada por unanimidade. Eu estive lá na Alba, conversei com vários deputados, e a recepção tem sido bastante positiva, tanto pela oposição quanto pela situação. Todos enxergam como bem-vinda e necessária esta mudança, para tentar minimizar, como eu já disse, este quadro difícil. São dezenas de milhares de pessoas que morrem por ano. No trânsito, principalmente. É preciso parar para acertar e resolver esta situação o quanto antes. E isso começa com a emancipação do Corpo de Bombeiros.

Aprovada a PEC, qual a próxima etapa?

Aí vem a aprovação da Lei de Organização Básica do Corpo de Bombeiros Militar da Bahia e do Código de Incêndio. Com esta legislação aí, o CB já começa a mudar a cara.

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