“O Brasil é um país sem memória”. Quem nunca ouviu e até proferiu essa frase? Quando se fala da história do povo negro, essa falta de memória fica muito mais evidente. Isso porque, assim como se deleta um arquivo, uma foto no celular, a nossa história foi propositadamente apagada, e sem chance de recuperar, como é possível naquele arquivo apagado do computador.
Essa falta de memória, transformada em invisibilidade histórica, é mais latente quando se trata de mulheres negras, fruto do caráter patriarcal e racista que constitui a sociedade brasileira desde o período colonial.
Diversas mulheres negras lideraram a resistência à escravização e as lutas em defesa da liberdade, mas seguem silenciadas por parte significativa da historiografia oficial.
Elas foram submetidas não apenas ao trabalho escravizado, mas também à violência sexual. Mesmo em meio a um contexto opressor, as mulheres articularam rebeliões, organizaram fugas e resistiram ao sistema, dentre essas mulheres guerreiras, Dandara do Palmares.
Em artigo publicado no dia 20 de maio, neste conceituado jornal A TARDE, afirmou-se ser invencionice a história e legado de Dandara dos Palmares, alegando-se a falta de provas documentais, afinal de contas, era simples e prático pra uma mulher negra e escravizada fazer o registro do seu enlace com Zumbi dos Palmares e do nascimento dos seus filhos no cartório ali da esquina, isso foi posto em xeque, em pleno século XVII, né?
É mais uma tentativa de apagamento da nossa história, que não tem registros documentais porque nossos antepassados escravizados foram desumanizados. À eles e elas, não foram dados os direitos de profecia de suas religiões, de falar seu idioma local, quiçá, registros oficiais.
Nos coube a história oral, contadas pelas nossas griôs. E nelas, temos a dimensão e a grandeza de quem foi Dandara dos Palmares, que não se resumiu a esposa do grande líder da resistência, Zumbi dos Palmares.
Dandara liderou e organizou o Quilombo dos Palmares, espaço de resistência que persistiu por mais de 100 anos à ira dos escravocratas.
Dandara era uma liderança dentro do Palmares, participava de batalhas, como uma verdadeira guerreira, além das atividades de pesca, agricultura, tudo isso sem nenhum tipo de registro histórico.
Dandara é, sim, uma das heroínas pelo fim da escravidão e deve figurar, sim, no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria.
Em pleno século XXI, onde os registros e documentos ficam até nas nuvens, não aceitaremos qualquer tentativa de apagamento.
Dandara, Luiza Mahin, Tereza de Benguela, Maria Firmina, Zeferina, Maria Felipa e tantas outras seguem como inspiração para seguirmos na luta por direitos e liberdade.
Viva Dandara dos Palmares, Heroína do Brasil!
*Artigo publicado no Jornal A Tarde domingo, dia 22 de maio de 2023