A tese de que os indígenas só têm direito às terras que já eram tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, é uma ideia defendida por muitos no Brasil e alcançou o Supremo Tribunal Federal, que tem analisado o tema. Há no país, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 226 processos suspensos nas instâncias inferiores do judiciário, à espera de uma definição sobre o tema. Portanto, não é um tema fácil e qualquer que seja a decisão tem um impacto enorme em diversas cidades brasileiras e nas suas populações, assim como em diversos setores econômicos.
No Estado da Bahia há diversas áreas aguardando as demarcações de terras indígenas, cuja decisão a ser acordada no STF impactará nos respectivos processos, pois, a tese será seguida por juízes e tribunais em casos semelhantes. O poder executivo também deverá seguir as orientações nos processos demarcatórios pendentes.
O debate também não pode ser enfrentado sob apenas uma ótica, visto que uma eventual interpretação que limite às demarcações de terras indígenas no país aos territórios ocupados até a promulgação da Constituição de 1988, ignora o histórico de expulsões e violência contra os diferentes povos originários ao longo da ocupação do espaço brasileiro.
Como sabido, a posse tradicional indígena é distinta da posse civil, conforme assentou a Constituição Federal de 1988, as terras habitadas em caráter permanente pelos indígenas e utilizadas para as suas atividades produtivas, culturais e de cunho sagrado e, estrategicamente, relacionadas à preservação dos recursos ambientais são necessárias aos povos originários e a toda sociedade brasileira. Essa áreas possibilitam o bem-estar e o desenvolvimento de usos, costumes e tradições das comunidades indígenas.
As áreas indígenas são reconhecidas após estudos de especialistas, que indicam a possibilidade de demarcação. Assim, tem-se o laudo antropológico cujo conteúdo é imprescindível para demonstrar a tradicionalidade da ocupação de comunidade indígena determinada, evidenciando os usos, costumes e as respectivas tradições.
Sendo assim, não é cabível exigir marco temporal para a aferição dos direitos possessórios indígenas sobre a área ocupada após diversas invasões e expulsões dos territórios pertencentes aos povos originários. Um bom ouvinte das aulas de História compreenderá que a ocupação do território brasileiro não foi pacífica. Os registros de violentos confrontos em terras baianas não negam. Ficar para morrer é uma exigência inglória.
Por: Efson Lima
Doutor e mestre em direito/Ufba. Advogado; coordenador de Inclusão Sócioprodutiva/SETRE-BA; militante do PCdoB.